Dez Dias em um Manicômio: Capítulo VIII: Dentro do Manicômio
Em 1887, a jovem jornalista Nellie Bly fingiu-se de louca para ser internada no manicômio da Ilha de Blackwell, em Nova York. O resultado foi uma reportagem sensacional que lançou a carreira de Nellie Bly, ajudou a criar o jornalismo investigativo e acelerou a luta antimanicomial.
A seguir, você confere uma amostra de Dez Dias em um Manicômio: Como uma Mulher Fingiu Insanidade para Revelar os Horrores do Hospício da Ilha de Blackwell e Ajudou a Inventar o Jornalismo Investigativo, de Nellie Bly.
Enquanto o coche atravessava rapidamente o lindo gramado que levava ao hospício, meu sentimento de satisfação por ter atingido meu objetivo foi sendo refreado pelo olhar deprimido nos rostos de minhas companheiras. As pobres mulheres não tinham esperança alguma de uma salvação imediata. Sem culpa nenhuma, estavam sendo levadas à prisão, provavelmente perpétua. Em comparação, seria muito mais fácil subir à forca do que entrar nessa tumba de horrores vivos! O coche foi adiante e eu, assim como minhas camaradas, dei um último adeus desesperado à liberdade quando avistamos os longos edifícios de pedra. Quando passamos por um dos prédios baixos, o fedor foi tão horrível que fui forçada a prender a respiração; mentalmente, decidi que era a cozinha. Mais tarde, descobri que estava correta em minha dedução, e sorri quando enxerguei a placa no final da trilha: “Proibidos visitantes nesta estrada”. Creio que a placa seria desnecessária se os visitantes tentassem seguir a estrada uma vez que fosse, especialmente em um dia de calor.
O coche parou e a enfermeira e o oficial encarregado nos mandaram descer.

— Graças a Deus, vieram quietas! — a enfermeira completou.
Obedecemos à ordem de subir um lance de degraus de pedra estreitos, evidentemente destinados àquelas pessoas que gostam de subir escadas de três em três. Curiosa em saber se minhas companheiras sabiam onde estávamos, perguntei à Srta. Tillie Mayard:
— Onde estamos?
— No Hospício de Lunáticos da Ilha de Blackwell — ela respondeu tristonha.
— Você é louca? — perguntei.
— Não, mas como fomos mandadas para cá, precisamos ficar quietas até descobrirmos algum jeito de fugir. Não vai ser fácil, no entanto, se todos os médicos forem como o Dr. Field e se recusarem a me ouvir e não me derem nenhuma chance de provar minha sanidade.
Fomos levadas até um vestíbulo estreito e a porta foi trancada atrás de nós.
Apesar da certeza sobre minha própria sanidade e da garantia de que seria solta em alguns dias, meu coração sentiu uma pontada. Declarada insana por quatro médicos especialistas e trancada atrás das grades implacáveis de um manicômio! Não ser confinada sozinha, mas ter por companhia, noite e dia, lunáticas insensatas e tagarelas; dormir com elas, comer com elas, ser considerada uma delas era uma posição nada confortável. Com muita timidez, seguimos as enfermeiras pelo corredor sem tapetes até uma sala cheia de mulheres supostamente loucas. Ela mandou-nos sentar e algumas pacientes fizeram a bondade de abrir espaço para nós. Elas nos olharam com curiosidade e uma se aproximou de mim.
— Quem mandou você para cá? — perguntou.
— Os doutores — respondi.
— Por quê? — ela insistiu.
— Bem, dizem que sou insana — admiti.
— Insana! — ela repetiu, incrédula. — Você não tem cara de louca.
Essa mulher era esperta demais, concluí, e fiquei contente em responder as ordens berradas de seguir a enfermeira e ver o doutor. Essa enfermeira, a propósito, a Srta. Grupe, tinha um rosto alemão simpático, e se eu não tivesse detectado certos traços de dureza em sua boca, teria esperado, como fizeram minhas companheiras, receber apenas bondade dela. A enfermeira nos deixou sozinhas em uma pequena sala de espera no fim do corredor enquanto entrou no escritório que se abria para a recepção.
— Gosto de ir até o coche — ela disse para o interlocutor invisível no lado de dentro. — Ajuda a quebrar a rotina.
Ele respondeu que o ar livre ajudava sua aparência e ela voltou para nós com um sorriso afetado.
— Tillie Mayard, venha cá — ela disse.

A Srta. Mayard obedeceu. Apesar de não ver o interior do escritório, eu conseguia ouvi-la defender seu caso em um tom gentil, mas firme. Todas as suas afirmações eram absolutamente racionais e imaginei que médico algum deixaria de se impressionar com sua história. Ela contou sobre a doença recente e que sofria de uma debilidade nervosa. Implorou que realizassem todos os testes de insanidade que tinham, se tinham algum, e que lhe dessem justiça. Pobrezinha, como eu tinha pena dela! Decidi naquele instante que minha missão no futuro seria usar todos os meios ao meu dispor para ajudar minhas irmãs em sofrimento, que mostraria como são trancafiadas sem um julgamento justo. Sem ouvir uma palavra de solidariedade ou encorajamento, ela foi trazida de volta aonde estávamos sentadas.
A Sra. Louise Schanz foi levada até o Dr. Kinier.
— Seu nome? — ele perguntou em voz alta.
Ela respondeu em alemão, dizendo que não falava inglês e que não o entendia. Contudo, quando ele disse “Sra. Louise Schanz”, ela respondeu “ja, ja”. A seguir, ele tentou outras perguntas, mas quando viu que ela não entendia uma palavra que fosse de inglês, se virou para a Srta. Grupe e disse:
— Você é alemã, fale com ela por mim.
A Srta. Grupe se revelou uma daquelas pessoas que têm vergonha da própria nacionalidade e se recusou, dizendo que entendia muito pouco do idioma materno.
— Eu sei que você fala alemão. Pergunte a essa mulher o que o marido faz da vida — e ambos riram, como se ele tivesse feito uma piada.
— Falo muito pouco — ela reclamou, mas finalmente conseguiu descobrir a profissão do Sr. Schanz.
— E de que adiantou mentir para mim? — o doutor continuou, com um sorriso que negava a grosseria da pergunta.
— Não posso falar mais nada — ela disse, e não falou.

Foi dessa maneira que a Sra. Louise Schanz acabou confinada ao hospício, sem a chance de se fazer compreendida. Qual seria a desculpa para tamanho descuido quando é tão fácil obter um intérprete? Se o confinamento fosse por apenas alguns dias, seria possível questionar sua necessidade. Mas aquela mulher fora levada do mundo livre para um hospício sem dar seu consentimento e lá não teve nenhuma chance de provar sua sanidade. Muito provavelmente presa pelo resto da vida atrás das grades do hospício, sem mesmo ser informada do porquê em seu próprio idioma. Compare o caso com o de um criminoso, que recebe todas as chances de provar sua inocência. Quem não preferiria ser um assassino e correr o risco do que ser declarado insano, sem nenhuma esperança de fugir? A Sra. Schanz implorou em alemão para saber onde estava, implorou por liberdade. Entre soluços, foi levada de volta até nós sem jamais ser ouvida.
A seguir, foi a vez da Sra. Fox de passar por esse exame fraco e trivial e sair do escritório condenada, então a Srta. Annie Neville. Fui deixada por último mais uma vez. A essa altura, estava decidida a agir da mesma maneira que quando em liberdade, exceto que me recusaria a contar quem era ou onde morava.